SENTENÇA
Processo n.: 0001113-70.2019.5.11.0008
Reclamante: FRANCISCO BARBOSA DA SILVA
Reclamada: AGGREKO ENERGIA LOCACAO DE GERADORES LTDA.
RELATÓRIO
FRANCISCO BARBOSA DA SILVA, em 19/09/2019, propõe ação trabalhista contra AGGREKO ENERGIA LOCACAO DE GERADORES LTDA.; com base nas alegações da petição inicial, formula os pedidos relacionados em item específico; atribui à causa o valor de R$ 83.654,40; e anexa documentos.
A parte ré apresenta defesa escrita (ID 1547430) acompanhada de documentos, onde contesta os argumentos da petição inicial e pede a improcedência da ação.
As partes comparecem à audiência; a conciliação é rejeitada. A parte autora manifesta-se sobre os documentos que acompanham a defesa. Em prosseguimento, são ouvidos os depoimentos do reclamante, da reclamada e de testemunha.
É realizada perícia técnica (ID 23b2c10), acompanhada de esclarecimentos (ID b9c96d6).
Encerra-se a instrução sem outras provas. As razões finais são remissivas. A nova tentativa de conciliação não tem resultado positivo. A publicação da sentença é agendada para esta data.
FUNDAMENTAÇÃO
Mérito
1. DOENÇA OCUPACIONAL – DANO MORAL
A indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho está constitucionalmente prevista no artigo 7º, inciso XXVIII, da CF/88. Já o Código Civil disciplina a responsabilidade civil em três dispositivos que se complementam, são eles:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
A ocorrência das moléstias narradas na petição inicial é incontroversa. A reclamada, contudo, alega em contestação que as doenças do reclamante não têm origem na atividade desenvolvida na ré, defendendo tratar-se de doença degenerativa.
O perito indicado pelo Juízo, após análise das condições de trabalho do autor, concluiu pela existência de nexo concausal entre a patologia na coluna lombar do autor com o trabalho executado na Reclamada. O expert classificou a concausa como média - Grau II ou Moderada, em relação à contribuição do trabalho para a patologia. Por fim, o perito não encontrou qualquer liame entre a lesão do joelho direito do autor e o trabalho ou suposto acidente
Ao apresentar esclarecimentos, o perito ratificou a conclusão exposta no laudo pericial.
Quanto à patologia no joelho direito, o reclamante não fez prova de que efetivamente sofreu o acidente narrado na petição inicial. Aliás, a prova dos autos revela que o reclamante sofreu acidente de moto, obtendo grave trauma no joelho direito. Ainda, a testemunha ouvida em Juízo declara que “o reclamante nunca sofreu acidente de trabalho e também nunca chegou a cair da empilhadeira”.
Assim, afasta-se a relação de causalidade ou concausalidade entre a atividade prestada na reclamada e a doença específica no joelho direito. Acolhe-se a conclusão pericial neste aspecto.
Pelo conjunto probatório dos autos, notadamente as observações do laudo pericial, tenho que se tornou inconteste que as atividades executadas pelo reclamante em favor da empresa, conjugadas com fatores extralaborais, foram causa para o agravamento de sua doença na coluna lombar. Não há dúvida de que a moléstia indicada pelo demandante provocou perda parcial e permanente da capacidade laboral.
A testemunha ouvida, e que trabalhava junto com o reclamante, na função de técnico eletricista, declara que “no período de 2014 a 2016 o transporte dos tambores era feito através de um carrinho que acoplava nos tambores, e que após, era empurrado”.
Portanto, a prova oral indica que efetivamente o reclamante empurrava carrinhos com os tambores, por pelo menos dois a três anos - 2014 a 2016. Ainda que não tenha ficado evidenciado que o autor efetuava tal atividade com a frequência apontada na petição inicial, há que se considerar que a testemunha diz que a reclamada fazia manutenção de uma quantidade expressiva de geradores - de 48 até 96.
Desta feita, demonstra-se a existência de nexo de concausalidade entre o adoecimento do autor e a doença ocupacional adquirida na coluna lombar, pelo que acolho a conclusão pericial no aspecto.
No tocante à responsabilidade civil do empregador por danos sofridos por seu empregado em virtude de acidente do trabalho, propaga-se, no direito comum, que esta é subjetiva. Por isso, necessária a comprovação dos seus pressupostos básicos, quais sejam, ação ou omissão (dolo ou culpa), nexo causal e resultado de dano.
Já a responsabilidade objetiva sofre delimitações pelo ordenamento jurídico. Além dos casos especificados em lei, não há que se perquirir dolo ou culpa sempre que a atividade do autor do dano implicar riscos, pois dele será a responsabilidade independentemente da sua vontade. Entretanto, é necessário que a atividade do agente seja caracterizada como de risco, isto é, deve conferir maior perigo ao trabalho desempenhado pelo empregado em comparação com os riscos aos quais estão expostos os demais membros da coletividade.
No presente caso, a ré possui como objeto o aluguel de máquinas e equipamentos. O autor exerceu as funções de assistente técnico. Por esse motivo, constata-se que o reclamante não estava exposto à situação mais gravosa, se comparada aos demais membros da coletividade. Os trabalhadores que atuam em empresa de aluguel de máquinas e equipamentos não estão sujeitos a riscos de acidente superiores à média dos indivíduos. Afasta-se, portanto, o disposto no parágrafo único do artigo 927 do CCB, que trata da responsabilidade objetiva decorrente dos riscos inerentes à atividade.
A responsabilidade civil que se estabelece é a subjetiva, importando perquirir a existência de culpa da reclamada quanto ao acidente sofrido e as doenças relacionadas. Nesse aspecto, a reclamada sequer comprova o fornecimento de equipamentos de proteção individual e a realização de treinamentos específicos ou demais medidas visando a atenuar os efeitos da prestação de serviços à saúde da obreira.
Ora, a Constituição da República de 1988, no inciso XXII, do art. 7º, elenca como um dos direitos fundamentais do trabalhador a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. E o art. 157, incisos I e II, da Consolidação das Leis do Trabalho, impõe ao empregador a obrigação de cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, instruindo os trabalhadores quanto às precauções no sentido de evitar acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais.
Uma vez admitida a ocorrência da doença ou acidente, cabia à reclamada demonstrar um mínimo de cautela. No entanto, a ré limitou-se a negar o nexo de causalidade, sem nem sequer apresentar comprovantes de curso de formação do reclamante, política de segurança no trabalho e utilização de equipamentos de proteção.
Em razão disso está caracterizada sua culpa, ainda que leve, visto que foi a ré negligente quanto ao fornecimento de meios a impedir o mal acometido pelo reclamante, devendo arcar com as consequências.
Isto posto, reconheço a existência de culpa da reclamada.
Considerando o poder ofensivo da conduta ilícita da reclamada (artigo 186 do Código Civil), os efeitos da ofensa na esfera íntima do trabalhador (intensidade da dor e duração das consequências), a situação social e econômica dos envolvidos e o grau de intensidade da culpa do empregador, bem como todos os demais critérios previstos no artigo 223-G da CLT, fixo, por um juízo de razoabilidade e por enquadrar a ofensa como de natureza média, a indenização por danos morais em 5 (cinco) vezes o último salário contratual do ofendido. Considera-se o salário de R$ 2.213,02, apontado no TRCT como correspondente ao recebido no mês anterior à extinção contratual (ID 40abf8e).
Defiro, com fundamento nos artigos 5º, V e X, da CF/88, 186, 187 e 927 do Código Civil e 223-C e 223-G da CLT, o pagamento de indenização por danos morais em 5 (cinco) vezes o último salário contratual do ofendido, no importe de R$ 11.065,10, atualizado até a data da publicação dessa sentença (Súmula 439 do TST).
2. REINTEGRAÇÃO/INDENIZAÇÃO
O art. 118, da Lei nº 8.213/1991, o qual prescreve que “o segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente”. Todavia, poderá a doença ocupacional ser constatada após a extinção do contrato, através da perícia médica, não sendo, neste caso, necessário demonstrar o afastamento por 15 dias, nem a percepção do auxílio-doença acidentário, conforme a inteligência da Súmula 378, II do C. TST.
Considerando que a extinção do contrato de trabalho deu-se em 13/06/2018, com a projeção do aviso prévio, o período de estabilidade findar-se-ia em 13/06/2019, nos moldes do art. 118 da Lei n. 8.213/91 c/c Súmula 378, II, do C. TST. Nesses termos, em que pese o reclamante ter direito à reintegração ao emprego, pois restou evidenciado nos autos o nexo de concausalidade entre as doenças listadas na exordial com o trabalho executado na reclamada, o período de estabilidade já se exauriu.
Diante do exposto, com arrimo na Súmula 396 do C. TST, condeno a reclamada, nos limites do pedido, ao pagamento de indenização pelo período estabilitário (13/06/2018 a 13/06/2019), correspondente aos salários e respectivas repercussões em aviso prévio, férias +1/3, 13º salário e FGTS (8% + 40%).
Como parâmetro de liquidação, deve ser utilizada a remuneração de R$ 2.213,02, conforme TRCT de ID. 40abf8e.
3. JUSTIÇA GRATUITA
Com fundamento nos artigos 790, §§ 3º e 4º, da CLT e 99, § 3°, do CPC, e considerando a declaração de pobreza juntada com a petição inicial, concedo à parte autora o Benefício da Justiça Gratuita.
Ressalte-se que a declaração de pobreza faz prova de tal condição, nos termos do artigo 1° da lei 7.115/83. Deve-se interpretar o artigo 790, §§ 3° e 4°, da CLT, conforme a CF/88, ou seja, em observância ao artigo 5°, inciso XXXV, da Carta Magna.
4. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA
Com fundamento no artigo 791-A, caput, da CLT, defiro honorários de sucumbência ao procurador do reclamante, no importe de 10% sobre o valor bruto apurado em liquidação de sentença.
Cumpre salientar que, segundo entendimento deste Juízo, a sucumbência do reclamante decorre, tão somente, do indeferimento de seus pedidos, mas não do mero deferimento quantitativamente menor de cada pleito. Adota-se, por analogia, o entendimento expresso na Súmula 326 do STJ. Assim, a título exemplificativo, horas extras, horas intervalares e valores indenizatórios deferidos a menor não caracterizam sucumbência para fins do cálculo de honorários.
5. COMPENSAÇÃO
Não há compensação ou abatimento a serem autorizados, pois as parcelas reconhecidas não foram pagas sequer em parte, ou foram contempladas apenas diferenças.
6. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
Os juros de mora correspondem a indenização a ser paga pelo atraso no cumprimento da obrigação, sendo, portanto, uma forma de recompor perdas e danos. Assim, para o cálculo dos juros de mora deve ser observada a data do ajuizamento da ação trabalhista e também, como termo final, a data do efetivo pagamento, conforme teor da Súmula nº 200 do TST.
Aos créditos trabalhistas incidem juros de mora desde a data do ajuizamento da ação, nos termos do artigo 883 da CLT. O percentual a ser aplicado é o de 1% (um por cento) ao mês, nos termos da Lei 8.177/91, ressalvadas as execuções contra a Fazenda Pública.
O art. 879, §7º, da CLT, com a redação dada pela Medida Provisória nº 905, de 11 de novembro de 2019, determina que, para os créditos exigíveis a partir de 11.11.2019, o índice de juros a incidir é o equivalente ao aplicado à caderneta de poupança. Ressalte-se que o STF decidiu pela impossibilidade de modulação de efeitos quanto a juros e correção monetária (RE 870.947 – decisão de outubro de 2019).
No entanto, revendo posição anterior, este Juízo, em análise detida do conteúdo da referida MP, afasta a aplicação do índice da caderneta de poupança, por considerar inconstitucional, tanto material, quanto formal, o conteúdo específico da MP 905/2019. Há violação ao artigo 62, caput, da CRFB, pois evidente a ausência dos requisitos de relevância e urgência. Há também inconstitucionalidade formal, uma vez que MP não pode tratar de matéria processual – art. 62, § 1°, I, b, da CRFB. Além disso, evidente que os juros da poupança não remuneram o capital de qualquer credor, não podendo o crédito trabalhista ser tratado de modo mais prejudicial. Há, aqui, afronta ao direito fundamental de propriedade – art. 5°, XXII, da CRFB, bem como à isonomia dos credores. Os credores civil e tributário estão sujeitos aos juros de 1%.
Assim, o percentual a ser aplicado é o de 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do Código Civil e 161, § 1°, do CTN.
Quanto à atualização monetária dos débitos trabalhistas, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente a Reclamação (RCL) 22012, ajuizada pela Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) contra decisão do TST que determinara a adoção do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) no lugar da Taxa Referencial Diária (TRD) para a atualização de débitos trabalhistas. Desse modo, não mais prevalece a liminar concedida pelo Ministro Dias Toffoli, a qual havia suspendido os efeitos da decisão proferida pelo C. TST.
Assim, não havendo declaração, em sede de controle concentrado, sobre a constitucionalidade ou não da aplicação da TR como índice de atualização dos créditos trabalhistas, relevante é a jurisprudência das cortes superiores em controle de constitucionalidade difuso sobre a matéria, que se orienta no sentido da inconstitucionalidade do referido índice, até mesmo pelas razões utilizadas pelo próprio STF em demandas de controle concentrado (vejam-se, por exemplo, as ADIs n.º 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425) e que não perdem o valor jurídico por se estar lidando com débitos trabalhistas.
Em face da inconstitucionalidade da aplicação da TR, deve ser utilizado o índice de atualização monetária sinalizado pelo TST - o IPCA-E. A inclusão do § 7° no artigo 879 da CLT, pela lei 13.467/2017, em nada altera a presente decisão, pois a norma celetista igualmente tem status de lei ordinária e faz expressa referência à Lei 8.177/91.
Não mais deve prevalecer a decisão do TST, de 20 de março de 2017, no processo TST-ED-ARgInc-479-60.2011.5.04.0231, que atribuiu efeito modificativo ao julgado e aplicou a modulação dos efeitos da decisão a contar de 25.03.2015. Isso porque, o STF, em recente decisão, de outubro de 2009 (RE 870.947), considerou incabível a modulação dos índices de correção monetária e juros de mora, determinando a aplicação do IPCA-E desde março de 2009.
Diante disso, determino a aplicação do IPCA-E como índice de correção monetária.
Adotam-se os entendimentos expressos nas Súmulas 200 e 381 do C. TST quanto ao tempo e modo de correção monetária.
7. ARTIGO 489, § 1°, DO CPC/2015
Nos termos do artigo 489, § 1°, do CPC, aplicável, de forma subsidiária, ao processo do trabalho, o juízo deve enfrentar os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a decisão por ele prolatada.
Conforme entendimento já firmado pelo C. STJ (ED MS 21.315-DF, de 15.06.2016), o julgador não está obrigado a responder todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. É dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada.
Por isso, embargos de declaração fundados exclusivamente na não observância do artigo 489, § 1°, do CPC, sem fundamentação específica, serão considerados protelatórios.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nos termos da fundamentação, julgo PROCEDENTES as pretensões de FRANCISCO BARBOSA DA SILVA para condenar AGGREKO ENERGIA LOCACAO DE GERADORES LTDA. ao pagamento de:
a) indenização por danos morais em 5 (cinco) vezes o último salário contratual do ofendido, no importe de R$ 11.065,10, atualizado até a data da publicação dessa sentença (Súmula 439 do TST);
b) indenização pelo período estabilitário (13/06/2018 a 13/06/2019), correspondente aos salários e respectivas repercussões em aviso prévio, férias +1/3, 13º salário e FGTS (8% + 40%);
c) honorários de sucumbência ao procurador do reclamante, no importe de 10% sobre o valor bruto apurado em liquidação de sentença.
Custas de R$ 600,00, a serem suportadas pela reclamada, fixadas sobre o valor de R$ 30.000,00, provisoriamente atribuído à condenação.
Concede-se à parte autora o Benefício da Justiça Gratuita.
Os honorários periciais foram fixados em R$ 1.200,00, e já foram adiantados pela reclamada (Id a17df78).
Autoriza-se a retenção das contribuições fiscais, observado o entendimento contido na Súmula 368 do TST.
Não há incidência de contribuições, ante à natureza indenizatória das parcelas deferidas.
Liquidação por cálculos.
Atualização monetária e juros de mora na forma de Lei e conforme critérios estabelecidos na fundamentação.
Intimem-se as partes.
Cumpra-se no prazo legal.
Nada mais.
MANAUS/AM, 16 de maio de 2020.
CRISTIANO FRAGA
Juiz(a) do Trabalho Substituto